Por CARLA MARÇAL DA SILVEIRA
20.05.2022
Hoje foi dia de ver fotos na Urca.
Muito escutei sobre o Breno cineasta, mas quero falar sobre o Breno meu irmão, mano.
De um lado, a família Silveira com um avô Breno, chefe de uma grande tribo de onde veio a fazenda e a política. Do outro, a família Marçal, de onde veio a música e a irmandade.
Fomos criados com muito amor e liberdade. Tudo podia. Tudo se falava. Tudo se via. O limite era a nossa própria consciência.
Nós, os filhos, éramos a pequena tribo, e Breno, lógico, o chefe da nossa tribo, o cara, o tal...
O mais velho do Clã. O que herdou o nome dos dois avôs. O pupilo Breno Luis.
Breninho. Mano, como a gente se chamava.
Muitas lembranças nos cercam. Em Brasília, banhos de piscinas intermináveis. Os olhos vermelhos de cloro e o churrasco para acompanhar. Brincadeiras à beira do lago e a mansão do vovô.
Na Argélia, todos de "hobe de cabeli" (a túnica argelina), a praia no Mediterrâneo, a Coca-Cola árabe. Na nossa escola, somando todos, eram 30 crianças. Na sala dele, duas. Ele e mais uma.
Em Recife, as férias. Lembro de uma viagem no Chevette amarelo do papai com cinco amassados dentro do carro, tocando Secos e Molhados, a única fita cassete que tinha, e eu pulando de colo em colo.
Chegando no nosso paraíso, todos os primos se juntavam e a tribo ficava completa.
Éramos tantos que só andávamos de Kombi ou caminhão. Em Itamaracá, no Telhadão, pousada da vovó, era tanto neto que tínhamos um departamento de quartos com colchonetes no chão e mosquiteiros em cima . Ficávamos soltos na ilha sem limites territoriais e sem regras. A tribo mais velha apenas observava e tirava bicho de pé quando precisávamos. Acho que nem tirávamos o biquíni para dormir, muito menos escovávamos os dentes. As atividades eram intensas. Banhos de mar com sargasso, passeios de canoa, jangada e lancha, banhos de açude no engenho, cavalo, mandioca, caju, cana, carambola, siri, caranguejo, rede, melamela, Carnaval, Olinda... e muito mais.
Tudo promovido pelo velho Breno, o avô.


Na Urca, a casa da família Marçal. Três andares na beira da praia cercados de muitas festas ao som de chorinho e do violão do tio Luiz. Escutávamos música o dia inteiro. A casa tinha o quartinho do som com paredes de disco onde as emoções se amplificavam .Nosso porto seguro. Nossa outra ilha. E a pequena tribo, Breno, Cacau, Lu, Dico, Dani e eu. Acho que moramos todos juntos ali por algum tempo. Breno gostava de implicar. Não podia ver ninguém perto de uma piscina que empurrava e saía correndo rindo. Uma vez, a Dani já adolescente, toda arrumada para sair com aquele batom vermelho na boca, ele passou a mão na boca dela transformando ela no Bozo. Breno não resistia. Era maior que ele. A gente sabe disso. Éramos ligados no 220, sempre promovendo ideias. Algumas deram certo. Como no Natal. A de pendurar o Dico numa corda e descer ele de um andar para o outro pela janela vestido de Papai Noel ao som de Jingle Bells para animar a festa dos velhos. Todas as crianças na produção sob o comando do Breno, segurando a corda no andar de cima para o Dico não cair. Ele corria para o quartinho do som, aumentava o volume no máximo e falava, "Vai!"... O filme tava pronto!!!
Deu certo!
Os velhos adoravam!
Outras deram errado. Como forrar uma bola de canhão do tio-avô com uma bola de borracha e pedir para tia Lea chutar. Errado. Muito errado. Quebrou o dedo dela.
Mas ele não parava de promover. Gostava mesmo de mexer com as emoções e principalmente promover felicidade.
Foi assim até ontem.
E eu, como a menor da tribo, sempre ali trabalhando para que tudo desse certo e a nossa felicidade prosperasse .
Foi assim até ontem.
Vai doer muito. Perdi o chefe da tribo. Perdi o rumo, a segurança. Mas somos fortes e feitos de amor e afeto e isso nos basta. Como diz
meu pai, é nossa religião.
Te amo, meu mano.
Fica em paz que a tribo vai continuar trabalhando para promover felicidade.

